quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O escolhido ou da bunda de calça plástica

Eu perdi este texto uma vez, isso já foi há uns dois meses. O escrevi, fiquei super contente com a redação, mas por um descuido no manuseio do mouse e do enter, acabei deletando-o completamente e salvando um texto por cima. Era a deixa, não era para ser publicado. Ponto.

Acontece que esta noite eu voltei a pensar nele. Sua reprodução não será fácil, mas vou tentar ser o mais verossímil possível. Tentarei.



Há uns dias atrás, depois de um exame, a fonoaudióloga que atendeu meu filho foi taxativa: “O Raphael não apresenta um reflexo, ele vai ter que passar pelo neuropediatra”. O possível problema acendeu um alerta na minha vida e de minha esposa. Fiquei muito triste, apesar de ser forte o bastante para aceitar e lutar por qualquer coisa nesta vida. Mas pensar que aquela coisa tão pequenininha, tão linda, pudesse sofrer por algo, me cortou o coração. Rezei como nunca pedindo para que qualquer coisa que o acometesse, acontecesse comigo e não com ele. Senti o peso da responsabilidade de ser pai. A palavra neuropediatra era muito forte, era muito dolorosa naquele momento.

Naqueles dias, sonhei com meu pai e com tudo o que aconteceu em nossa vida. Também havia sido muito triste perdê-lo no começo deste ano, principalmente porque eu entendi que poderia ter feito tanta coisa diferente. Infelizmente a vida não nos é perfeita como gostaríamos, mas como fazemos por merecer.

Um dia a tarde, depois de uma jornada mega estressante no serviço, com a cabeça cheia e triste pelo meu filho, cheguei em casa e o peguei nos braços, como sempre fazia. Sentei com ele na sala, tirei os meus sapatos e comecei a falar com ele. Olhava para aquela coisinha linda e dizia: “o papai está aqui meu filho, sempre estará”. Mais que instantaneamente, comecei a chorar. A tristeza era muito grande. Foi então que o inesperado aconteceu. Pela primeira vez naqueles poucos meses de vida, meu filho deu uma gargalhada. Ele já sorria há tempos, mas foi a primeira vez que seu sorriso tomou contornos sonoros. Foi uma gargalhada que me fez soluçar. E o soluço acabou com o choro, acabou com a tristeza, acabou com tudo. E eu sorri também. Sorri e entendi o recado. Meu filho, naquele momento, mostrou a pureza de coração que lhe fazia me ensinar. Ensinar que a vida é mais bem vivida com um sorriso, independente da situação.

Toda a apreensão antes da consulta com o neuropediatra foi substituída pela certeza de que a vida, assim como acredito, é o nosso quintal, nosso canto, onde vivemos (ou deveríamos viver) intensamente. Aprendemos com tudo e caminhamos no intuito de sermos pessoas melhores que outrora. Pessoas mais conscientes da vida, do amor, das relações com as pessoas próximas, das relações com o mundo e com as coisas divinas.

Aquela gargalhada foi a certeza de que se alguma coisa estivesse realmente acontecendo, seria muito mais fácil se nós nos uníssemos, na assertiva de que seríamos capazes de ser a família que sempre sonhamos. E ele estava certo. Sua gargalhada era o sinal de que tudo estava bem, tudo estava em ordem, tudo estava dentro da normalidade, mesmo que a normalidade não fosse a corriqueira. Tudo estava certo. Certo de que certo seria. Certo de que o amor seria sempre nosso esteio.

A consulta passou. Nada foi detectado. A única coisa que ficou constatada é que a vida sempre vence, apesar de tudo. Mesmo nos mais difíceis e inóspitos ambientes, ela existe, e com um único propósito: fazer-nos viver. Fazer-nos viver sempre.

Anderson Mendes Fachina