Ele tinha tudo para estar feliz,
mas não estava. Aliás, esse tudo, era na visão dos outros. Ninguém sabe
realmente o que ele passava, a não ser ele. Por fora, o que se via era um cara
contente, família, com um emprego estável, muito bem encaminhado na vida. E isso,
sempre deu a falsa ideia de que sua vida era muito boa, pois assim sendo, não teria
do que reclamar.
Mas ele carregava algumas coisas
que não lhe deixavam dormir. Aquele “mesmo sonho” não lhe deixava em paz, assim
como sua vida. Nada lhe deixava em paz. Sua mente trabalhava incessantemente. Entre
um sorriso e outro, as decepções se acentuavam em sua mente e nada lhe parecia
estar correto. O sol que brilhava lá fora estava longe de aquecer seu coração. A
chuva que caia insistentemente estava longe de lavar sua alma.
Sua vida estava ruindo. Mas,
infelizmente, aos outros esses avisos não eram perceptíveis. Ele tinha tudo
para ser feliz, lembra? Então estava defronte um problema muito sério. Enquanto
suas estruturas estavam corroídas e prestes a cair, sua face cotinha nuances
sabores mil, contratando e ajudando ainda mais aquela equação desesperadora.
Outro dia, ao se deitar, ele puxou pra perto de seu peito toda a beleza que o acompanhava. Seus cabelos cheiravam a caramelo, aquele mesmo que lhe fazia lambuzar quando criança. Sua face, seu corpo, tudo era lindo e estava ali, em seus braços. Passava as mãos por entre os cabelos como quem estivesse sonhando acordado. E estava. Sonhava que a vida poderia ser diferente, que este belo poderia realmente ser parte de seu braço, de seu corpo. Mas, como sempre, esta beleza que estava perto levantou-se e saiu, repetindo o gesto dos corações que já não se encontravam mais.
Ele não tinha mais o brilho de
outrora, de quando acreditava na vida, nas pessoas. E o engraçado é que tudo já
foi começando meio errado e ele viu, achou que dava, as coisas foram caminhando
e ficando mais erradas ainda e ele contemporizando... Até que ficou. Ficou como
estão hoje, nesse balançar dúbio que tem numa ponta da gangorra a vida que as
pessoas acham que ele tinha e na outra a vida que ele realmente tinha. E seu sofrimento tem aumentado tamanhamente
que parece estar prestes a corroer as estruturas que ainda lhe restam. Estava em
perigo!
O que ele pensava sobre sua vida
eram coisas muito depressivas. Pensava que não tinha nenhuma funcionalidade na
instituição que ele próprio ordenava. A instituição de sua vida. A instituição
das coisas que a gente vê como primordiais. E por mais que se esforçasse para
ser diferente dos demais, por mais que se esforçasse para mostrar que as coisas
poderiam ser mais simples, por mais que se esforçasse... Suas forças eram em
vão. E o empurravam ainda mais para o abismo que ele guardava dentro de si. “Estou
a dois passos, do paraíso”, cantava. “E a meio passo do precipício”, pensava. O
sonho desta noite havia sido duro demais. Realmente ele precisava voltar à
cadeira daquela pessoa que lhe havia aberto mais a mente outrora. E ele vai
voltar. Já estava marcado.
Anderson Mendes Fachina